O amor homossexual
25/11/2011
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Por Arthur Virmond de Lacerda Neto
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Intitulado “A origem e
o desenvolvimento das idéias morais” o volumoso tratado de Eduardo Westermarck,
publicado em dois volumes, em Paris, em 1928, inédito em Português. Professor
de sociologia na Universidade de Londres, analisou ele algumas manifestações do
comportamento humano, em inúmeras culturas e povos, no passado e no presente,
em que encontrou semelhanças e dissemelhanças, demonstração de que as idéias
morais constituem-se culturalmente, como produtos de cada porção da Humanidade,
e decorrem, como lembrava Augusto Comte, da natureza humana, ou seja, da
humanidade comum a todos os homens. Um dos capítulos do livro intitula-se “O amor
homossexual”, que passo a traduzir:
A satisfação do
instinto sexual assume formas que não entram no quadro ordinário da natureza.
Há uma que, dentre outras, em razão do papel que desempenhou na história moral
da humanidade, não devera ser omitida: é o comércio entre indivíduos do mesmo
sexo, hoje conhecido pelo nome de homossexualidade.
Encontra-se
frequentemente entre os animais. Ele se apresenta, sem dúvida, pelo menos
esporadicamente, em todas as raças humanas. Em certos povos, assumiu a
envergadura de um verdadeiro hábito nacional.
Na América,
observaram-se costumes homossexuais em um grande número de tribos indígenas.
Parece que houve, quase por toda a parte no continente, desde os tempos
antigos, homens vestidos de mulher, que cumpriam as funções femininas e que
viviam com outros homens, como as suas concubinas ou como as suas mulheres.
Assinala-se, além disto, entre homens jovens companheiros de armas, ligações de
amizade que, segundo Lafitau, “não permitem nenhuma suspeita aparente de vício,
embora haja ou possa haver muito vício real”.
A homossexualidade
acha-se espalhadíssima ou assim se achou, entre os povos que habitam as regiões
costeiras do mar de Behring. Em Kadiak era uso, quando se tinha um filho com
trejeitos femininos, de vesti-lo como mulher e de educá-lo como tal; ensinavam-se
lhe apenas os trabalhos domésticos, davam-se lhe por ocupações apenas as
tarefas das mulheres e apenas mulheres ou meninas por camaradas. Com a idade de
dez ou quinze anos, eram casados com algum homem rico e ele recebia, então, a
alcunha de “achnuchik” ou “shoopan”. Havia a mesma prática entre os
Tchouktchis, segundo o relato do dr. Bogoraz; ei-lo: “Ocorre frequentemente,
que, sob a influência sobrenatural de um “chamão”, ou sacerdote, um jovem
tchouktchi de dezesseis anos abandona, de súbito, o seu sexo, e acredita ser
uma mulher. Ele adota uma farpela feminina, deixa crescer os cabelos, dedica-se
inteiramente a ocupações de mulher. Indo mais longe, este difamador do seu sexo
toma um marido nos “yurt” e assume todas as tarefas que, normalmente, incumbem
à esposa, impondo-se, a si próprio, uma servidão voluntária, a mais contrária
do mundo à natureza. Acontece assim, freqüentissimamente, que em um “yurt”, o
marido seja uma mulher, e mulher, um homem! Estas trocas anormais de sexo levam
à imoralidade mais abjeta na comunidade(1) e parecem ser fortemente encorajados
pelos “chamãos”, que interpretam casos deste gênero como determinações da sua
divindade particular”. Tal mudança de sexo acontecia, amiúde, paralelamente com
a perspectiva de se tornar “chamão”; de fato, a maior parte dos “chamãos”
havia-a realizado, outrora. Ainda se encontra, correntemente, entre os
tchouktchis, “chamãos” masculinos vestidos de mulher e que passam por haverem,
fisicamente, transformado em mulheres; muitas outras tribos siberianas
conservam vestígios de uma crença idêntica. Em certos casos, pelo menos, é
induvidoso que estas “transformações” hajam sido acompanhadas de práticas
homossexuais. Na sua descrição dos koriaks, Krasheninnikoff fala dos “ke`yev”
ou homems que desempenhavam funções de concubinas; ele compara-os com os
“koe`-kcuc” do Kamtschatka, ou homens que se transformaram em mulheres. Todo”
koe´-kcuc”, diz ele, é considerado mágico e intérprete dos senhos; contudo, a
sua descrição confusa permitiu que Jochelson cogitasse de que o traço mais
importante da instituição dos “koe´-kcuc” residira menos no seu poder
“chamanístico” do que na sua capacidade de satisfazer os desejos contra a
natureza dos kamtchadales. Os “koe´-kcuc” vestiam fatiotas de mulher, efetuavam tarefas de mulher e
ocupavam a posição de mulheres ou de concubinas. (Prosseguirá).
1 - Bem entendido que o autor citado (Bogaraz)
julga segundo os seus padrões de moralidade, vale dizer, os cristãos.
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"O amor homossexual" (Parte Dois)
Por Arthur Virmond de Lacerda Neto
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Por Arthur Virmond de Lacerda Neto para a Revista Lado A
No arquipélago malásio,
o amor homossexual é coisa corrente, não, contudo, em todas as suas ilhas; ele
é comuníssimo entre o povo bataque, da Sumatra. Em Bali, ele é praticado
abertamente e há profissionais seus. Os “basir” do povo Daiaque são homens cujo
ofício corresponde à bruxaria e à libidinagem. “Vestidos de mulher, são muito
solicitados nas festas idólatras, para as abominações sodomíticas e muitos
acham-se casados com homens”
O dr. Haddon disse que
jamais ouviu dizer, no estreito de Torrés, de homossexualidade, porém na região
de Rigo (a Nova Guiné inglesa) encontraram-se vários casos de pederastia e em
Movat, distrito de Daudai, é vício corrente. Ela é, dizem, difundida nas ilhas
Marshal e no Havaí. No Taiti há uma categoria de homens que os locais chamam de
“mahous” e que “adotam as véstias, a pose, as maneiras das mulheres e imitam
todas os trejeitos e exibicionismos das mais fúteis dentre elas. Eles
freqüentam, sobretudo, as mulheres, que lhes estimam a convivência. Da mesma
forma como as maneiras, eles adotam os usos mais especiais das
mulheres...Somente ou quase somente os chefes encorajam semelhante abominação.
Eis em que termos Foley fala dos neocaledonianos: “A maior fraternidade entre
eles não é uterina, porém a das armas. É assim, sobretudo, na vila de Poepo. É verdade que esta fraternidade
marcial é complicada com a pederastia”.
Entre os indígenas da
região de Kimberley (Austrália ocidental)
ao jovem que, havendo alcançado a idade núbil, não encontra mulher,
oferecem-lhe um rapaz, o “choucadou”. Observam-se, aqui também, regras
exogâmicas e o “marido” deve evitar a sua “sogra”, como se esposara uma mulher.
No momento da sua iniciação, o “choucadou”é um garoto de cinco a dez anos. “As
relações existentes entre ele e o seu bilalou”, diz Hartman, “são assaz
obscuras. De que haja entre eles uma ligação, não tenho dúvidas, mas os
indígenas repelem com horror e desgosto a idéia de sodomia”. Tais casamentos
são totalmente correntes. Como, amiúde, as mulheres são monopolizadas
pelos membros mais velhos e importantes
da tribo, é raro encontrar um homem de menos de trinta ou quarenta anos que
possua uma: de onde a regra de que todo rapaz, ao completar cinco anos, é dado
como rapaz-esposa a algum dos homens mais moços. Segundo o quadro que traça
Purcell, os nativos do mesmo distrito, “todo membro inútil da tribo” arranja um
garoto de cinco a sete anos e dele serve-se para fins sexuais; estes garotos
chamam-se de mulavongas. Entre os chingalis (Austrália meridional, território
do norte) observam-se, frequentemente, velhos que não dispõe de mulheres e,
contudo, a quem acompanham um ou dois rapazolas: eles os protegem zelosamente e
mantém com eles relações sodomíticas. Que as práticas homossexuais sejam conhecidas em outros tribos
australianas, é o que se pode concluir da constatação de Howitt, a propósito
dos indígenas do sudoeste. Os velhos, diz, proíbem os crimes contra a natureza
aos noviços, desde que estes ultrapassaram a sua iniciação. (Prosseguirá).
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O amor homossexual (Parte Três)
13/02/2012
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Por Arthur Virmond de Lacerda Neto
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Em Madagascar, há
jovens rapazes que vivem como mulheres e que têm relações com homens; eles
pagam aos que lhes agradam. Em um velho relato, do século XVII, lê-se isto: “Há
alguns homens que eles chamam de tsecats, que são efeminados e impotentes, que
procuram rapazes e fingem-se de apaixonados; imitam as moças e vestem-se como
elas, presenteiam-nos para dormirem com eles e chegam a atribuírem-se nomes de
moças, fazendo-se de envergonhadas e de modestas. Eles odeiam as mulheres e não
as querem frequentar.” Também se observaram homens efeminados entre os ondonga
(na África sub-ocidental alemã) e entre os diaquitê-sarracoleses (Sudão
francês) ; porém faltam-nos pormenores acerca dos seus hábitos sexuais. As
práticas homossexuais são correntes entre os banaca e os bapucu (Camarões).
Porém eles parecem ser relativamente raros entre os indígenas da África, em
geral, salvo entre os povos de língua árabe e em países como o Zanzibar, em que
a influência árabe é acentuada. Na África do Norte, tais hábitos não se limitam
aos habitantes das cidades; elas são frequentes entre os camponeses do Egito e
universais entre os jbala, montanheses do norte do Marrocos. Por outro lado,
são muito menos correntes, mesmo raras, entre os berberes e os beduínos
nômades; quanto aos beduínos da Arábia, acham-se inocentes deles.
A homossexualidade é
difundida na Ásia Menor e na Mesopotâmia. Ele é frequentíssima entre os
tártaros e os caratchais do Cáucaso, entre os persas, os sics e os afegãos: em
Cabul, um bazar ou uma rua lhe é reservada. Os viajantes antigos falam da
enorme extensão da homossexualidade entre os maometanos da India: parece que,
sob tal aspecto, o tempo não trouxe modificações. Na China, em que ela é, igualmente,
comuníssima, há casas especiais de prostituição masculina e são numerosos os
meninos vendidos por seus pais desde os seus quatro anos de idade, para
exercerem tal mister. No Japão, a pederastia remonta, dizem alguns, às idades
mais afastadas; para outros, ela foi introduzida pelo budismo, cerca do século
VI da nossa era. Os monges viviam com belos rapazes, com quem, frequentemente,
achavam-se apaixonadamente ligados; na época feudal, não se via, quase,
cavaleiro que não tivesse por favorito um rapaz com quem ele mantinha as mais
íntimas relações e por quem ele achava-se sempre pronto a bater-se em duelo,
quando se lhe apresentasse a ocasião. Encontravam-se, ainda, em meados do
século XIX, casas de chá em que as gueixas eram do sexo masculino.
Atualmente [o autor
escrevia em 1929] parece que a pederastia é mais frequente no sul do Japão do
que no norte; contudo, há regiões em que, por assim dizer, ela não é conhecida.
Não há alusões à
pederastia nos poemas homéricos nem em Hesíodo; contudo, mais tarde, a Grécia
erige-a quase em instituição nacional.
Roma e outros lugares da Itália cedo a conheceram; com o tempo, ela tornou-se
lhes mais frequente. Em fins do século VI, diz-nos Políbio, muitos romanos
pagavam um talento para possuir um belo rapaz. No Império, “era usual, nas
famílias patrícias, de dar-se ao rapaz púbero um escravo da mesma idade como
companheiro de leito, afim de que ele pudesse satisfazer os seus primeiros
impulsos genesíacos”; houve casamentos formais entre homens, celebrados com toda
a solenidade das bodas normais. Averígua-se a existência de práticas
homossexuais entre os celtas; elas não eram ignoradas, longe disto, dos antigos
escandinavos, que adotavam toda uma nomenclatura relativa a elas.
(Prosseguirá).
1 A pederastia grega
consistia na relação de companheirismo e dedicação de um homem de até cerca de
25 anos por um adolescente, em que o mais velho chamava-se de erastes e o outro
de erômenos. O erastes solicitava o erômenos à família deste e a relação entre
ambos principiava mediante a anuência dela. Não havia penetração anal entre
eles e sim o coito intercrural, em que o erômenos deitava-se de costas e o
erastes friccionava o pênis entre as suas coxas.
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